A inteligência artificial (IA) vem transformando silenciosamente a saúde pública brasileira. No SUS, algoritmos já analisam exames, priorizam casos urgentes e sugerem condutas clínicas, aplicando-se em três frentes: diagnóstico clínico, vigilância sanitária e gestão de serviços. A tecnologia promete agilidade, precisão e eficiência no cuidado ao paciente, mas especialistas questionam: até que ponto o sistema está pronto para confiar suas decisões a máquinas?
Um dos maiores desafios é o viés algorítmico. Sistemas treinados com dados homogêneos podem falhar ao lidar com a diversidade demográfica do país. “Um algoritmo treinado em uma realidade urbana pode não refletir a vida de pacientes em comunidades rurais. Por isso, ele nunca pode substituir o olhar clínico”, alerta o pediatra e neonatologista Dr. Marcelo Carvalho.
Outro ponto crítico é a proteção de dados. Informações médicas são sensíveis e exigem anonimização, criptografia e políticas rigorosas de governança. “A tecnologia oferece ferramentas, mas a cultura de segurança é que garante a privacidade”, explica Leonardo Tristão, CEO da Performa_IT. Sem confiança na proteção das informações, a adesão de profissionais e da população pode ser comprometida.
Apesar dos desafios, a IA oferece benefícios concretos: triagens mais rápidas, diagnósticos mais precisos, gestão eficiente de recursos e monitoramento remoto de pacientes crônicos. Segundo Tristão, “a IA funciona como copiloto do médico, aumentando a precisão e liberando tempo para um atendimento mais humano”.
Especialistas destacam que a humanização do atendimento depende do uso correto da tecnologia. Ao automatizar tarefas burocráticas, os profissionais podem se dedicar mais ao paciente. Mas se a IA assumir o contato direto com o paciente, o risco é desumanizar o cuidado.
Para consolidar a IA no SUS, faltam infraestrutura digital adequada, padronização de dados, capacitação de profissionais e regulação ética clara. “A decisão final sempre será humana. Algoritmos oferecem velocidade e escala, mas a empatia e o julgamento clínico não podem ser automatizados”, afirma Tristão.
À medida que a IA se integra às rotinas clínicas, o debate ultrapassa o campo técnico e se torna ético, social e político. O desafio não é substituir médicos, mas unir tecnologia e cuidado humano para tornar o SUS mais eficiente, justo e acessível.
A verdadeira revolução, concluem especialistas, não será apenas tecnológica, mas humana, apoiada pela inteligência artificial.
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